sexta-feira, 31 de dezembro de 2010


Não tenhas nada nas mãos
Nem uma memória na alma,

Que quando te puserem
Nas mãos o óbolo último,

Ao abrirem-te as mãos
Nada te cairá.

Que trono te querem dar
Que Átropos to não tire?

Que louros que não fanem
Nos arbítrios de Minos?

Que horas que te não tornem
Da estatura da sombra

Que serás quando fores
Na noite e ao fim da estrada.

Colhe as flores mas larga-as,
Das mãos mal as olhaste.

Senta-te ao sol. Abdica
E sê rei de ti próprio.

Ricardo Reis

sábado, 25 de dezembro de 2010

Este ano as nuvens não abriram. Escondem as estrelas e tentam fazer desaparecer memórias, outros anos em que havia quem visse as estrelas e sonhasse com um mundo onde a felicidade anda de mão dada connosco.

Chove e tenho frio.

Vou ver o presépio. Olho o Menino, a Sagrada Família. E em cima o Anjo que tinha posto há pouco, bem me parecia que faltava qualquer coisa quando o fizémos. Fico a absorver um mundo sem Tempo, onde o pastor guarda as ovelhas, os Reis prosseguem a sua viagem encaminhados pela Estrela, onde o simples musgo é árvores, planície e fantasia, onde reina a Paz.

Então percebo que o Menino sorri atrás das nuvens e fico a sentir os pingos frios da chuva na cara. E lembro-me que uma das mensagens do Natal é tentar descobrir as bençãos onde menos parece que as há, e agradecer. Ter esperança.

E lá no alto, acabo por ver as estrelas brilhar.

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Natal


Antes do Cristianismo, já antes o Natal era comemorado, as suas origens remotam a uma tradição pagã, na altura via-se que as noites iam-se tornando cada vez maiores, tinha-se até medo que deixasse de existir dia, e então festejava-se porque marcava o momento em que o dia voltava a crescer e a luz ganhava às trevas. A origem da palavra Natal provem do latim, de um vocábulo que quer dizer "nascer". O Cristianismo, também como forma de melhor se enraizar na sociedade, aproveitou esta data. E hoje em dia o Natal tem o significado que nem é preciso descrever.
Este ano parece que o Natal chegou de repente, sem avisar. Quando somos miúdos o Natal vem ter connosco, agora é altura de irmos nós ter com o Natal. Gosto desta época. Parece que tudo emana uma espécie de atmosfera de felicidade, uma felicidade que parece que vai caindo lentamente como farrapinhos de neve, que se desfazem na mão, mal os agarremos. E quanto mais depressa a tentamos segurar e manter connosco, mais depressa ela desaparece, tal como quando agarramos um farrapinho de neve com mais força, mais rápido se transforma em água. Adoro os presépios, as luzes, as músicas. Tem graça mas parece que tem mais magia ouvi-las na rádio do que no mp3, talvez seja porque não estamos à espera, somos surpreendidos.
Quando era menino (se é que agora ainda não sou), a minha mão disse-me para deixar os sapatos à lareira na noite de consoada porque o Menino Jesus vinha de noite e deixar-me-ia um presente. Qual não foi a minha surpresa quando de manhã vi lá umas moedas! Lembro-me que nessa altura acreditei que tinha sido mesmo o Menino Jesus. Acho que foi das poucas, se não a única vez, em que fui completamente crédulo. Nunca acreditei em Pais Natais nem em coelhinhos da Páscoa. Mas talvez isso não fosse acreditar, porque para acreditar precisamos de ter dúvidas.

Esta noite tenho de encontrar o Natal, o Meu Natal. Um Natal que nos conta a história de um Menino que nasceu numa manjedoura, ao pé de uma vaca e um burro. Um Natal que nos ensina uma mensagem de simplicidade, de esperança no mundo e no futuro, de paz e harmonia, de renovação, de vida, de Deus.
Hoje deixarei os meus sapatos na lareira. Quando chegar de manhã, sei que o Menino Jesus terá lá vindo e deixado magia num sapato, e força de vontade no outro. Sei que sim.

Porque o Verdadeiro Natal acontece no nosso coração.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

V

Já muito tempo passou, Lídia,
E estou surpreendido comigo.
Parece que já não sinto aquela chama que tudo devora,
A tua imagem desvanece-se facilmente,
Mesmo quando vejo o pôr-do-sol.

Não compreendo.
Tanta magia, tanto sentimento,
Tanta saudade, tanta fugacidade,
E agora tudo o que resta parece um simples resíduo
De um fósforo ardido.

Não percebo como se consegue,
Fazer promessas, juras escritas na areia,
Que o mar leva logo à primeira onda.
Talvez seja normal porque não é amor.

Vivemos na ilusão,
Porque pensamos que amamos,
E no fundo a única coisa que se faz,
É colocar inúmeras expectativas numa pessoa,
É transportar tudo o que pode depender de nós,
Transpô-lo para alguém,
E colocar todo o peso da nossa alegria nessa pessoa.
Até mesmo da felicidade (seja lá o que isso for).

Olhando melhor é só egoísmo,
É chantagem.
Mas é compreensível,
Pois a nossa carne é fraca,
E isso enfraquece o espírito.

Não somos perfeitos,
Por isso amar é errar.

Não me venham com coisas,
Porque todos nós temos fraquezas,
Todos nós temos medos,
Por mais fortes e corajosos que sejamos,
Ou aparentemos ser
(Como acontece na maioria das vezes).

Não vejo grandes diferenças
Entre um sábio, um louco e uma pessoa "normal".
Diferem só na forma como vivem com as dúvidas:
Enquanto um tenta construir e aprender com elas,
Pensando que descobriu algo de novo,
Outro entra em pânico, e outro esquece-as.
Dorme.

Dormimos todos.
Como um bébé no seu berço,
Somos embalados pelo Tempo.

Ele embala não como uma ama
Que com carinho gosta do bébé,
Mas com a frieza de quem foi incumbido pelos deuses
A fazer esse chato trabalho para toda a eternidade.

De vez em quando alguns de nós acordam,
E vendo onde estão, ou melhor,
Vendo que não estão onde pensavam que estavam,
Começam a chorar.
Então o Tempo dá-lhes um guizo,
Não por pena,
Mas porque se enfada com o nosso barulho.

Então voltamos a dormir de olhos abertos.

Se o amor é o mais importante na vida,
Aquilo que nos faz saborear a eternidade da nossa finitude,
Tem que vir de dentro de nós
E não se concentrar em ninguém.

Só se concentra porque somos fracos,
E temos medo de coisas como a solidão,
Que de vez em quando nos aparece
Com as suas vestes negras,
E o seu toque gélido.

Para amar, abdica,
Derrota primeiro os teus monstros.
Depois poderás amar,
Pois serás livre.

E pronunciei o teu nome uma só vez.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Um Hallelujah

Tudo começou num autocarro. O rádio ia relativamente alto na RFM, e não era daquelas vezes em que a cabeça parece que ia rebentar, para além do mais quando as músicas desta rádio não são propícias para isso. Estava contente, tínhamos acabado de ganhar nas meias finais do Interturmas. É quando começa a tocar uma música que nunca tinha ouvido, mas que bastou ouvir os primeiros acordes e gostei. A senhora que no autocarro se encarregava de vigiar os miúdos e (aparentemente) garantir que levam o cinto de segurança, veio cá atrás, e comentou "Hum, tenho esta música no telemóvel", "Como se chama?", "É "Hallelujah" de "Alexandra Burke". Curiosamente, tínhamos uma ideia para a prova livre da final, e pensei que esta seria a música adequada.
E esta música representa uma das coisas mais marcantes do meu secundário, não só quando actuámos, mas quando ensaiávamos, demos todos as mãos, e ouvimos o Nosso Hallelujah. Nada pode apagar o silêncio depois, a amizade, ali, uma turma, unida. Ainda agora me é muito esquisito lembrar-me de momentos como este e saber que fazem parte do passado, já não voltam. Parece que não quer sair, teima a ficar algures entre o presente e o passado, suspenso.
Hoje, num contexto muito diferente, outra vez num autocarro, toca um "Hallelujah", outra vez na RFM. À frente, umas pessoas conversam. Já passaram muitos Hallelujah desde então, e algumas vezes apetecia-me deixar de ouvir, tal era a volúpia de sentimentos que trazia. Mas é claro, ouvia até ao fim. Desde o "I herd that it was a secret chord, that David played and it pleased the Lord, but you don't really care for music, do you?" até ao "It´s cold and it's a broken Halllelujah". Hoje está frio lá fora. Olho a chuva oblíqua, o vento que a traz. Mas cá dentro o ambiente é aconchegador. Não só porque está quente, mas porque há um Hallelujah que se revive. Se fechar os olhos, sei que estou noutro mundo, noutro dia, e não estou sozinho. Porque há um Hallelujah. Um Hallelujah de paz, um Hallelujah de saudade, um Hallelujah de sentimento, um Hallelujah de amizade. Um Hallelujah que ficou algures perdido desde que uma turma o ouviu de mãos dadas. Um Hallelujah que está sempre a querer desaparecer, mas sobrevive, revive, porque está no coração.

O meu Hallelujah, o Hallelujah do meu 12.ºB, para sempre<3.

sábado, 13 de novembro de 2010

A princípio estava difícil de acender mas o vento lá deu uma ajuda. O fogo é algo curioso: parece que se vai extinguir, mas basta colocarmos um combustível para reaparecer das cinzas, literalmente. É o que dá depender de algo e destruí-lo para existir.
O vento parecia que brincava com o fogo como uma criança com plasticina. Imagino que esta fogueira para ele seja uma bola mínima, que lhe não dá prazer nenhum de moldar, assim como uma criança ignora um pedacinho mínimo de plasticina. Logo ele não faz o fogo ondular porque se diverte, mas unicamente porque simplesmente tem que passar
O céu estava nublado, prometia chuva, não podia ver as estrelas. Mas imaginava-as lá atrás e podê-las imaginar ainda é melhor, a realidade limita as coisas. Começou a cair uma chuva miudinha. Parecia que fazia cócegas na pele. Talvez nesta altura o fogo tivesse sentido medo, uma vez que aparecia o seu eterno rival, o seu eterno vencedor. No entanto, talvez o seu medo não viesse daí, dado que de qualquer forma, a sua existência é bastante efémera.
O fogo tem algo que nos enfeitiça, podemos ficar a olhar para ele tempos infindos... Provavelmente porque seja um reflexo do fogo que há em nós: tanto é luz no meio da escuridão, como nos consome.

domingo, 17 de outubro de 2010

Poema IV

Sofro, Lídia, porque uso demais a razão.
Pensar incomoda mais que urticária,
É mais viciante que droga,
Faz com que as dúvidas nos consumam.

Se para quem sente o pior da vida é a morte
(no sentido literal),
Para quem pensa o pior da vida é nascer,
Soltar um choro silencioso.

Não porque o ar lhe doa nos pulmões,
Mas porque a consciência lhe dói na alma.
Não porque se sente desprotegido fora da mãe,
Mas porque percebe a ilusão em que vive.

Nasceu, porque perdeu a ingenuidade.
É como quando, ao longe,
Parece que vemos uma linda flor amarela,
E queremos ir mais perto para contemplá-la.

Mas quando nos aproximamos,
Reparamos que afinal se trata de um ramo pálido.
A partir daí, mesmo que queiramos ver de longe,
A imagem da flor esvaner-se-á sempre.

Assim como quando se perde a ingenuidade,
Por mais que a tentemos recuperar,
Dificilmente voltará.
Quem me dera não ter chegado perto da flor.

Quando vejo os teus olhos, Lídia,
E sinto a tua cabeça encostada no meu ombro,
Sinto o meu coração estremecer,
Por breves momentos vou recuperando a inocência perdida,

Somos meras crianças,
Brincando com as estrelas.
Embala-me, Lídia, com o teu doce sorriso,
Deixa-me só ver flores, onde a palidez reina.

Mas já não estás comigo,
Foi-se o meu coração,
E os sonhos cor-de-rosa.
Que no fundo nada eram.

Para ser feliz, sê criança:
Olha o mundo com os olhos de uma.
Só assim deixarás de pensar,
E amarás, porque nada mais existe.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Paz


Sentia-me tranquilo. Não tinha expectativas, não tinha inquietações. Estava em harmonia com a Natureza. Para além de sentir a brisa, queria ser o vento que passa, e nada mais faz. Queria ser a água que corre, e simplesmente deslizar. Queria ser os pássaros que voavam, e deixar de tocar as estrelas apenas quando sonhava.
Sentia-me em paz. Quase sentia a Paz. Gostava de ser a paz.

Acordei. Mas acho que não estava a dormir, nem me parece que tenha sonhado. Volto a sentir o peso do mundo. Foi uma miragem, ou uma ilusão. Se a única diferença entre a morte e a ausência é a esperança, entre a paixão e a maldição é a magia, a única diferença entre o sonho e a ilusão é a fé.

Sinto-me sereno. O que parecia doce e sorridente agora parece que perde a magia, a fé, a esperança: é isto que faz parte da nossa alma. Sei que nunca acabarão, assim como a Paz nunca chegará.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Boiando, com rumo incerto


Enquanto olhava hoje o rio, chamou-me à atenção ver uma garrafa de vidro, boiando à superfície, por entre as ligeiras ondulações da água, avançando lentamente pelo curso do rio, com uma rota indefinida, incerta, ou talvez determinística mas indeterminável devido à complexidade do mundo que a envolve. Alheia a isto tudo lá vai, esta garrafa, certamente com a sua história, que a levou até ali. Lembro-me logo de uma história romântica, como a da garrafa que esteve na origem do amor entre Theresa e Garrett, em "As Palavras Que Nunca Te Direi". Talvez ela transporte também um poema, uma mensagem, para um amor perdido, uma paixão efémera, uma ilusão que persiste. Pode ser que simplesmente tenha saltado de um qualquer caixote do lixo, ou o mais provável, que uma qualquer pessoa tenha consumido o álcool do seu interior, e como a preguiça é muita, se tenha desenvencilhado dela da maneira mais fácil e a tenha atirado ao rio.

Às vezes sinto-me um pouco como na situação da garrafa: simplesmente a flutuar, tranquilamente, algures perdido sem ter a certeza de que o rumo é certo ou de que o controlo, algures perdido, ao sabor das ondas e do vento, à beira de ir ao fundo, algures perdido entre o que era, o que sou, e o que não tenho a certeza que quero ser. Mas o mais provável é que seja sempre a mesma pessoa, sim, sou, só que o que me rodeia é que muda, e mudou bastante há um ano. Talvez seja como aquela montanha na Oceânia, Ayers Rock, que muda de cor ao longo do dia, mas o que a constitui é sempre o mesmo, o que muda é o ângulo de incidência dos raios solares.

Alheia a isto tudo, a todas estas divagações que quase nada são, lá vai a garrafa, sem bússola, sem rumo. Talvez vá para a reciclagem, talvez acabe no mar, talvez acabe em mínimas lascas de vidro. Ou talvez alguém acabe por ler a mensagem no seu interior, e uma Theresa e um Garrett se encontrem. Oh, que opção ilógica, que probabilidade infimíssima. Mas quem sabe?

domingo, 19 de setembro de 2010

Ser é quase

Ser é quase.
É um colóide, uma substância translúcida,
uma névoa, uma neblina,
que é dissipada pelo sol da morte.
A morte é deixar de ser,
transforma a energia do ser,
do amor, do ódio,
numa energia sombria, escura, de luto,
de esquecimento.
Mas que importa que um breve nevoeiro,
caia e esteja destinado ao esquecimento?
Ser é indefinição.
Nem nada se consegue ser,
é impossivel ser nada,
e assim, também e impossível ser tudo.
Ser é uma forma pouco nítida,
onde se mistura uma escuridão
como a morte e uma luz
como Deus.
Ser é efemeridade, beleza, arte,
é imperfeição, é falta.
É quase. É vida.

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Haverá algo mais belo?


Já passa das 21 horas. No final de um dia de trabalho no campo percorro a pé o caminho em direcção a casa. Vai anoitecendo tranquilamente, começa a ficar escuro, o sol já se pôs e os tons vermelhos e alaranjados do horizonte vão desaparecendo. A terra está cansada depois de mais um dia de calor, mais um em milhões de anos, as plantas respiram de alívio pois já não está tão quente, mas continua a faltar-lhes a água que tanto precisam. Noto que os grilos cantam, como é tão característico de uma noite de Verão, e como estou tão habituado, às vezes nem dou o devido valor a este pormenor (como tudo na vida).
Olho melhor para o horizonte. Uma faixa de nuvens separa duas cores diferentes: por baixo, o alaranjado que adivinha o pouco tempo que o sol se pôs, por cima azul habitual do céu, que já não tem a vivacidade do dia. Esta faixa cria um efeito bonito, retira as descontinuidades habituais das cores do céu, e parece que divide o mundo em trevas e luz, criando uma fronteira bem definida.

Páro, e fico um pouco a admirar, a sentir o momento, sorrio, e lembro-me daquilo que muitas vezes nos esquecemos: as coisas verdadeiramente Belas são aquelas que estão ao nosso alcance no dia-a-dia.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Não sei se é realidade, ou se simplesmente ela existe


Cada vez que tento olhar tudo o que me rodeia, tudo o que sou, tudo o que o mundo é e não é, mais percebo como tudo é relativo, e como as fronteiras são ténues: que o mundo não é feito de brancos e pretos, nítidos, fáceis de perceber, como por vezes os filmes e livros nos fazem transparecer. É sim de cinzentos de diversas tonalidades, sendo que uma coisa que é cinzento-claro, pode tornar-se escuro (e vice-versa) dependendo do tempo que passa, ou simplesmente do local onde se encontrar e da forma como olham para ela. Compreendo agora a necessidade de edificar e descobrir leis da natureza e do Homem, de criar valores absolutos, porque mundo é relativo e algo que parece fortíssimo, construído sobre pilares sólidos, vem-se a descobrir que é frágil, e que no fundo é tal como um baralho de cartas: basta uma brisa mais forte para se desmoronar. Perceber que basta um pequeno pormenor para aos olhos dos outros passar do 8 ao 80, ou de bestial a besta. Talvez a única coisa absoluta no fundo seja a relatividade, assim como talvez o único destino seja não haver destino, ou que a única verdade seja não haver Verdade. Percebo que entro numa maré de paradoxos, que paradoxalmente são os que têm mais sentido, ou melhor, que têm menos falta de lógica, onde as conclusões são inexistentes e quase impossíveis de extrair, e enquanto penso lembro-me daquela frase "o Homem pensa, Deus ri". Ou como se dizia num filme "a loucura é como a gravidade: às vezes basta só um empurrãozinho", mas como diz Mário de Sá Carneiro "em terra de doidos, quem tem juízo é doido", e voltamos à relatividade de tudo, relatividade essa que já é lei. Tudo é uma coisa só, pois existem ligações entre áreas aparentemente distantes: esta lei física de Einstein, apesar de partir de premissas diferentes, acaba por chagar a uma conclusão que tem como pano de fundo algo que esta implícito nas nossas relações com os outros, e também connosco mesmos, quer nas expectativas, quer nas ideias que possuímos. E parece que o mais o mais idílico e puro se situa numa terra distante, que por se situar nosso coração parece que está próxima, quase possível de se tocar, e no entanto o véu que impede que se lhe toque é tão suave, e ao mesmo tempo tão difícil de romper. E quanto mais se pensa mais difícil parece, sendo que mesmo isto é relativo.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

O que eu escrevo nunca foi Ricardo Reis, Lídia




Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio.
Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendamos
Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.
(Enlacemos as mãos.)

Depois pensemos, crianças adultas, que a vida
Passa e não fica, nada deixa e nunca regressa,
Vai para um mar muito longe, para ao pé do Fado,
Mais longe que os deuses.

Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer não gozemos, passamos como o rio.
Mais vale saber passar silenciosamente
E sem desassosegos grandes.

Sem amores, nem ódios, nem paixões que levantam a voz,
Nem invejas que dão movimento demais aos olhos,
Nem cuidados, porque se os tivesse o rio sempre correria,
E sempre iria ter ao mar.

Amemo-nos tranquilamente, pensando que podiamos,
Se quiséssemos, trocar beijos e abraços e carícias,
Mas que mais vale estarmos sentados ao pé um do outro
Ouvindo correr o rio e vendo-o.

Colhamos flores, pega tu nelas e deixa-as
No colo, e que o seu perfume suavize o momento —
Este momento em que sossegadamente não cremos em nada,
Pagãos inocentes da decadência.

Ao menos, se for sombra antes, lembrar-te-ás de mim depois
Sem que a minha lembrança te arda ou te fira ou te mova,
Porque nunca enlaçamos as mãos, nem nos beijamos
Nem fomos mais do que crianças.

E se antes do que eu levares o óbolo ao barqueiro sombrio,
Eu nada terei que sofrer ao lembrar-me de ti.
Ser-me-ás suave à memória lembrando-te assim — à beira-rio,
Pagã triste e com flores no regaço.

Ricardo Reis

(~Simplesmente Sublime~)

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Mundial



Bem, e lá acabou o Mundial no domingo. Desilusão para alguns, alegria para outros, festa para muitos, na primeira competição deste tipo realizada em África. A Espanha não praticou um futebol tão bom como o do Euro 2008, mas foi um justo vencedor. O Uruguai talvez tenha sido a principal surpresa, se bem que os seus adversários até à meia-final não tenham sido "tubarões", mas isso de longe que não lhes retira o mérito, já que demonstraram muita determinação e capacidade de luta, para além de terem o eleito melhor jogador, Diego Forlan. Não foi um Mundial para as "estrelas", como Messi, Ronaldo, e que deixou sem dúvida um sabor um pouco amargo a nós portugueses. Mas não falemos de coisas tristes.
Falando de figuras fora de campo, não se pode deixar de referenciar o molusco cefalópode actualmente mais conhecido mundialmente, o polvo Paul. Porquê? Como toda a gente sabe, adivinhou todos os resultados da Alemanha no Mundial, bem como que a Espanha iria vencer a final. Como o fez? Eram-lhe dadas duas caixas de comida, cada com uma bandeira, e a caixa de onde tirasse o alimento seria a da selecção que ganharia (ainda não percebi muito bem como é que seria se Paul quisesse prever um empate, mas não interessa). Em suma, as visitas ao seu aquário na Alemanha dispararam, é uma autêntica vedeta, e já recebeu uma proposta de transferência (qual jogador, qual quê) para um aquário espanhol. Já foram feito pedidos para que passe um resto de vida tranquilo (tem mais de dois anos, está a ficar velho para um polvo, não sobreviverá para o Euro2012), o que eu acho difícil, dado que um polvo que é vidente, obviamente que preocupar-se-á com questões profundas, como a vida para além da morte, e então nunca ficará descansado.
Do lado feminino, para além do episódio romântico do beijo de Casillas à sua namorada que o estava a entrevistar depois da final ganha, há que destacar Larissa Riquelme, pela forma entusiasta como apoiou a sua selecção, o Paraguai, chegando até mesmo a dizer que se despia caso eles chegassem às meias-finais. Agora já todos percebemos porque é que Óscar Cardozo estava a chorar depois de perder com a Espanha, não foi por ter falhado um penaltie, mas porque assim ela já não se despiria.
Segundo um estudo de um banco holandês, a Espanha também sairá beneficiada economicamente desta Copa, pois consta que o país vencedor obtém ganhos de produtividade, e consequentemente, um maior crescimento do PIB. Foi uma competição com muita excitação, sem grandes incidentes, uma demonstração por parte de África do que é capaz. No entanto a maioria dos estádios ficarão agora às moscas. Lembro-me da pergunta que fizeram a um sem-abrigo sul-africano sobre se o Mundial lhe tinha trazido algo de bom ou alguma vantagem. "Nada", foi o que respondeu. Afinal, também há vida para além do futebol.

domingo, 4 de julho de 2010

Bom ou mau?


O dia 1 de Julho de 2010 foi um dia marcado por um acontecimento (relativamente) importante. Não porque foi o aniversário de alguém que morreu (certamente que foi, só que não é isso que vou destacar), ou porque nasceu alguém com potencial para tornar o mundo um local melhor (bem, isso só saberemos daqui a uns anos). Não a grande notícia é que foi um dia de uma coisa a que nos começamos a habituar: aumento de impostos.
Uma senhora, quando entrou de manhã no autocarro, e viu que o preço do bilhete tinha aumentado 5 cêntimos, começou logo a protestar e a dizer mal do país. Só espero que essa opinião assim como muitas outras que por aí andam tenham como base uma breve reflexão. Não é só ver que os preços aumentam e começar logo a dizer mal disto e daquilo. Muitos pontos se podem destacar, e queria referir alguns.
Na campanha eleitoral para as legislativas, quando os partidos eram questionados sobre aumentos de impostos, todos os partidos garantiram firmemente que isso não ia acontecer. Apesar de alguns dizerem isso porque acreditavam que não era o caminho certo, temo que alguns tenham feito isso por demagogia. Em cerca de um ano algumas coisas mudaram, como a pressão dos mercados, as descidas de "rating", a exigência de medidas de austeridade por parte de Bruxelas (ou melhor, da Alemanha), colocaram uma forte pressão na urgência de tomar medidas para equilibrar as contas públicas. Ah, e de acrescentar que um défice que era previsto para ser à volta de 7%, por magia, afinal é 9,4% (afinal voltou a ser 9,3%, segundo novas contas do INE). No entanto não seria preciso ser muito inteligente para analisar as contas públicas e perceber que, mais tarde ou mais cedo, teria de se aumentar receitas ou cortar na despesa. O que se coloca em questão, é que há um problema estrutural na despesa pública em que falta tocar seriamente.
Estará também em causa numa altura em que a crise financeira e económica não acabou, pôr em prática medidas de impacto recessivo na economia, isso talvez deixasse Keynes boquiaberto. De recordar que ter défice não é algo mau, desde que seja utilizado para propulsionar o crescimento económico de forma sustentada. Em Portugal, talvez tenha havido um despesismo em coisas fúteis e investimentos duvidosos. Desde regalias excessivas, a subsídios atribuídos a pessoas que não mereciam, gastos em construções que não têm retorno nem grande utilidade para o grosso da população... Agora, como se gastou em coisas desnecessárias, retira-se o dinheiro às pessoas que realmente precisam e trabalham.
Finalmente, uma pequena questão interessante em relação ao aumento do IVA. Há situações em que a oferta decide não aumentar preços, e suportar o imposto, como por exemplo num café. Em outras, o consumidor suporta todo o imposto, como nos medicamentos. Mas numa situação de mercado normal, o consumidor não suporta todo o imposto, como muitas vezes se pensa. A quantidade de imposto suportado pelo consumidor e produtor depende da elasticidade da oferta e da procura, ou seja, da sensibilidade em relação ao preço. Assim, por exemplo, o consumidor suportaria totalmente o imposto se a elasticidade da procura fosse 0, isto é, se o consumidor procurá-se sempre a mesma quantidade independentemente do preço. O mais próximo desta situação seria com bens alimentares, essenciais à sobrevivência.
Fica uma breve reflexão, uma análise mais profunda fica para os especialistas. Há uma grande diversidade de pontos de vista, sendo que estas medidas visam uma sustentabilidade de longo-prazo, no entanto o longo-prazo não é se não mais do que uma soma de vários curtos-prazo.

Ricardo Reis Revisited III


Sabes, Lídia,
Se olharmos à nossa volta com atenção,
Reparamos que a maioria das coisas
Que movem as pessoas são ilusões.

Rio-me da inconsciência de quem
Quer agarrar o mundo,
Como se o pudesse ter sempre.
Mas nada é realmente nosso.

Tudo é passageiro Lídia,
A única coisa que podemos decidir
É se é fugaz e intenso,
Ou tranquilo e suave.

De qualquer forma,
Independentemente do caminho,
Sofreremos no fim.
Isso é o que nos assusta a todos, Lídia.

Faz-nos fugir, tentar ignorar,
Mas nada podemos fazer.
Nenhuma lei pode ilegalizar e prender o sofrimento.
Deixa-nos cicatrizes, faz-nos crescer.

Mas ultrapassá-lo totalmente é impossível
Porque é ele que nos espera no fim.
Por mais fortes, por mais persistentes.
Trata-se só de adiar o que é certo.

Se a vida são dois dias, Lídia,
E um é para acordar,
O outro tem que ser
Para tentar voltar a adormecer.

Tentar voltar a dormir a vida,
Tentar recuperar a ingenuidade,
Porque percebemos que o mundo é sofrimento,
E aterroriza-nos pouco poder fazer para mudar isso.

Deixar de ter consciência que estamos
Somente a distrair a vida.
(Ou talvez seja ela que nos distrai?)
A sentir como ela é tão relativa.

Mas tu mudaste esta forma de ver as coisas, Lídia.
Acordaste e não perdeste a ingenuidade.
Continuas com um sorriso como estado natural.
E não perdeste o brilho nos Olhos.

Não sei se estás acordada,
Ou somente a sonhar enquanto dormes.
Mas afinal, que interessa?
Fascina-me, ver isto em ti.

Consegues ser algo que nunca serei.
Não percebo como gostaste ou ainda gostas de mim.
Ainda bem que foste,
Não te mereço.

Serve-me de consolo que o meu amor
Seja como a tua maneira de ser.
É única coisa que me faz dormir um pouco da vida,
E só por isso vale a pena.

Dói estar sempre a acordar,
Mas sabe tão bem adormecer.
E tudo graças a ti, Lídia,
Que deste para sempre um outro significado ao meu pôr-do-sol.

terça-feira, 29 de junho de 2010

Fim


Caramba, perdemos.
O senhor da banca de jornais bem tinha razão quando disse "o 24 Horas acabou hoje para não ser sozinho com Portugal". Não, disse eu, "Portugal logo vai ganhar!", acreditava, acreditei até ao fim e continuarei a acreditar. Não quero falar de opções tácticas, da falta de qualidade de certos jogadores, da simples incapacidade.
Tristeza, acima de tudo. É assim um jogo, é assim a vida. Amanhã voltaremos ao nosso país normal, à descrença geral, às criticas que nada constroem. Fim. Novo começo, nova oportunidade, continuar a tentar, continuar a errar, continuar a aprender, manter a cabeça levantada. E, por Fim, vencer.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Abrigo


E fico assim, sentado, junto ao muro.
Fico a olhar para ti,
A ver o meu reflexo no teu olhar.
Dás-me a tranquilidade que preciso,
Dás-me o sorriso que me foi tirado,
Dás-me a criança que fui,
Se não me dás, ajudas a que dê a mim mesmo.

Fico assim, a espera que digas alguma coisa
E vou saboreando o silêncio
Imagino as palavras que vamos trocar
E aquelas que nunca trocaremos.
Penso em todas as promessas
Que serão escritas na areia,
E em todos os momentos, gravados no coração.

Fico assim, e encostas a tua cabeça no meu ombro,
Olhamos as estrelas para alem do céu azul,
Olhamos as nuvens, imaginamos com que se parecem.
Vemos elefantes, gigantes, rostos,
Que se vão desfazendo com o vento
Mas não desaparecem,
Só se transformam noutras formas.

Fico assim, e não sinto o tempo passar,
Nós estamos a iludi-lo e a ignorá-lo.
Ele far-se-á sentir nas rugas no nosso rosto.
Mas agora não, somos só nós,
Em comunhão com o mundo.

Fico assim, sentido o calor do teu corpo,
Protegendo-nos um ao outro
Da crueldade dos homens,
Revivendo a ingenuidade,
Tocando o arco-íris dos nossos sonhos.

Fico assim, os tons do horizonte começam a ficar alaranjados,
O sol vai-se por mais uma vez em milhões de anos
Hoje tem mais duas pessoas a contemplá-lo.
Dizes que ficavas assim para sempre,
Só respondo com um sorriso triste
Porque também sinto o mesmo,
Mas sei que é impossível.

Fico assim, e aparecem as primeiras estrelas,
Do outro lado do pôr-do-sol
A tua respiração acalma
E adormeces nos meus braços com um sorriso nos lábios
Beijo-te a testa, encosto-me mais a ti.
Ouço o ruído silencioso da noite
E apercebo-me da ilusão do mundo.
Cai uma estrela cadente.
Peço o desejo de ficar para sempre assim.

Fico assim, e a única coisa que fica para sempre assim
É o calor da tua alma na minha.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

José Saramago


Seria muito difícil não deixar uma palavra para este senhor. Levou o nome de Portugal longe, também pelo prémio Nobel, que lhe deu projecção, mas acima de tudo, pela sua escrita. Porque é preciso perceber que Saramago não foi um grande escritor por receber o prémio Nobel, mas recebeu um prémio Nobel por ser um grande escritor.
Os meus conhecimentos sobre a sua obra são muito superficiais, só algumas reflexões. É óbvio que haverão sempre coisas em que não se concordam, por exemplo no meu caso a ideia de Portugal e Espanha se unirem num só país, ou as tão polémicas ideias do livro "Caim". Já antes Saramago tinha dito que não compreendia que se Deus existisse, como poderia criar um mundo com tanto sofrimento (não será a negação também um caminho para Deus?). Mas o que é de salientar é que uma pessoa que nasce numa aldeia pequena, de origens humildes, pode chegar tão alto. Foi um autodidacta, com uma maneira de pensar avançada, tudo palavras que já foram ditas, e que espero que tenham sido proferidas com sinceridade, porque são verdadeiras.
O saramago é uma planta, que nasce espontaneamente normalmente nas sementeiras, mas que não é invasiva. Também José Saramago se tornou o que é, de forma natural. Lembro-me de uma frase n' "O Memorial do Convento": "Só os pássaros voam, ou os homens, quando sonham". Agora, Saramago está a voar pelos seus livros, por todas as pessoas que o homenageiam, uma energia que nos faz Sonhar, para além da morte.

domingo, 13 de junho de 2010

Ítaca

Quando partires, em direcção a Ítaca,
que a tua jornada seja longa
repleta de aventuras, plena de conhecimento.

Não temas Laestrigones e Ciclopes nem o furioso Poseidon;
não irás encontrá-los durante o caminho, se
o pensamento estiver elevado, se a emoção
jamais abandonar o teu corpo e o teu espírito.
Laestrigones e Ciclopes e o furioso Poseidon
não estarão no teu caminho
se não os levares na tua alma,
se a tua alma não os colocar diante dos teus passos.

Espero que a tua estrada seja longa.
Que sejam muitas as manhãs de Verão,
que o prazer de ver os primeiros portos
traga uma alegria nunca vista.
Procura visitar os empórios da Fenícia
recolhe o que há de melhor.
Vai às cidades do Egipto,
aprende com um povo que tem tanto a ensinar.

Não percas Ítaca de vista,
pois chegar lá é o teu destino.
Mas não apresses os teus passos;
é melhor que a jornada demore muitos anos
e o teu barco só ancore na ilha
quando já estiveres enriquecido
com o que conheceste no caminho.

Não esperes que Ítaca te dê mais riquezas;
Ítaca já te deu uma bela viagem;
sem Ítaca, jamais terias partido.
Ela já te deu tudo, e nada mais te pode dar.

Se, no final, achares que Ítaca é pobre,
não penses que ela te enganou.
Porque te tornaste um sábio, viveste uma vida intensa,
e este é o significado de Ítaca.

Konstantinos Kavafis (1863-1933)

(o problema é que queremos sempre mais de Ítaca, e esquecemo-nos do Resto, e não, isso não é sonhar)

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas

Portugal.
Ultimamente temos estado nas luzes da ribalta das agências e mercados financeiros, e não é pelas melhores razões. A economia ainda está num estado anémico, sem saber bem se já saímos ou não da crise. Continua a necessidade de apertar mais o cinto, depois de anos a viver acima das possibilidades e com problemas de competitividade. A política também está numa situação delicada, e pouca gente continua a acreditar nos políticos, e vêem os seus salários espremidos.
O que é ser português? Associadas a todas estas questões, há uma identidade por decifrar e por descobrir. Pequenos pormenores podiam ser importante para virar este ponto: por exemplo o ensino da história portuguesa durante o ensino básico. Muitas são as vozes que criticam que o enfoque na história de Portugal dos últimos séculos é fraca. Ora, conhecer a nossa história é relevante para construirmos a nossa identidade, e perceber o modo como chegámos aos dias de hoje, e todas as coisas que, ao longo de muitos anos, estão incorporadas nos "genes" nacionais, porque não nascemos hoje, temos uma História que nos preenche. Mesmo assim, haverá sempre grandes Homens e acontecimentos que ignoraremos. Mas a maior diferença está na mentalidade das pessoas, no capital social, se mudarmos certas atitudes no nosso quotidiano, poderemos avançar e crescer. Nós de longe que somos capazes disso, estamos sempre a criticar e a dizer que não somos capazes, mas no fundo acreditamos, só temos é falta de confiança. Basta haver um pequeno "clique" que nos faça trazer essa crença para tudo o que fazemos. A união em torno da selecção é um exemplo disso, a forma como vibramos, como apoiamos, mostra que tudo é possível, e que por mais pequenos em tamanho que sejamos, somos Grandes, sim, porque isso é Portugal: Grandeza, um povo que já resistiu a tanta coisa, que apesar de tantas adversidades, continuou a vencer. Se já passámos por tanta coisa bem pior, não há-de ser hoje que iremos cair. Continuaremos a procurar Algo que vai mais além das coisas materiais. Como Pessoa escreveu, "Senhor, falta cumprir-se Portugal!"

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Polémicas

Agora anda por aí uma polémica sobre uma professora de Mirandela que se despiu para uma revista masculina. Coloca-se em causa se esta professora não devia ser demitida. Em termos de valores, esta situação é muito similar com uma que foi bastante mediática, só que noutro país: o ex-capitão da selecção inglesa, Jonh Terry, perdeu a braçadeira devido ao facto de ter traído a sua esposa, com a esposa de um companheiro de selecção, Wayne Bridge.
As questões de fundo para estas duas situações são as mesmas: por um lado diz-se que a vida privada de uma pessoa e extra-profissão nada tem que ver com a actividade profissional, e por isso não há problema. Por outro lado, ser professor ou capitão de selecção tem uma série de conceitos e valores implícitos e associados, como o carácter, a honra, a honestidade, o exemplo que tem que dar para os seus adeptos e cidadãos ou para os seus alunos e pais. A questão que se coloca é qual dos pratos desta balança é que pesa mais. Na minha opinião, concordo com o facto de terem retirado a bandeira de capitão, porque para ser capitão de selecção não basta ser bom jogador, tem que se ter uma personalidade forte e, acima de tudo carácter. Tem que se perceber que numa posição destas somos a referência para muitos jovens e uma forma de os ajudar a criar bons valores. Uma situação ainda pior aconteceu com Tiger Woods, que a meu ver corrigiu da melhor maneira o que tinha feito (8 ou 9 "facadinhas" não é para qualquer um), mas o que falta ver é se volta ou não a cometer os mesmos erros.
Quanto à professora de Mirandela, retirando aqueles comentários habituais do tipo "com uma prof destas é que dá gosto ter aulas", acho que ser demitida ou não já não é importante. A polémica que se gerou à volta dela foi bem mais positiva que negativa: passou a ser uma referência para a diversão nocturna e media de interesse masculino. E isto não é algo isolado, é um sintoma preocupante da sociedade em que vivemos.
Quando alguém quiser aumentar os seus rendimentos, basta inventar algo que gere polémica e passará a ser o centro das atenções, o que é bastante lamentável. Mas afinal ela não é bem professora, e deixarei a opinião de Miguel Sousa Tavares, retirada do Expresso de Sábado, que toca neste ponto:

"O que mais me despertou a atenção na maravilhosa aventura programada da célebre professora stripper de Mirandela, foi descobrir duas coisas: uma, que ela, afinal, não é professora, mas sim "monitora de tempos livres"; a outra, que tem um ordenado por inteiro mas um horário de apenas seis horas semanais, as quais pode acumular todas num dia, ficando com o resto da semana livre. Será que se eu me despir, também me arranjam um emprego destes?"

Ora aqui está uma boa sugestão que eu irei anotar quando entrar no mercado de trabalho. Tristeza...

domingo, 6 de junho de 2010

Ricardo Reis Revisited II

Duas semanas passaram, Lídia,
Mas parece uma eternidade desde que partiste.
O tempo passa mais devagar
Mas o teu perfume continua com a mesma intensidade.

O aroma dos teu cabelos continua
Na almofada, no baloiço, no banco de jardim.
E quando alguma folha cai das árvores
E passa ao de leve no meu rosto

Parece o toque da tua mão.
Acho que o rio e as flores
Têm saudades tuas,
E tentam-me a passar a sua tristeza.

Há dois tipos de tristeza:
Uma, é a passageira,
Mais tarde ou mais cedo
Será tomada pela alegria

É como se fosse uma manta escura
Que tapa a luz dentro de nós.
A outra tristeza é mais implacável,
Não tapa a luz, apaga-a mesmo.

Talvez seja aquilo a que a Medicina,
Com a mania de explicar
Sentimentos com químicos e genes,
Chame de depressão.

A única tristeza que há em mim, Lídia,
É a primeira, porque o meu amor por
Ti impede que a minha Luz se apague.
Ah, acho que devia ter-te dado um beijo de despedida.

Sentir-te-ei sempre,
Mas quem sabe se te voltarei a ver?
Para quê tantos complexos
Se vamos morrer e não sabemos o que está do outro lado?

O vento acaba de me trazer uma carícia tua
E pergunta-me se quer que leve alguma coisa.
Leva um beijo meu, vento,
Para que possas sentir aquilo que devia ter feito.

Ás vezes somos fracos, sim,
Porque não nos chega uma promessa,
Porque desconfiamos,
Porque precisamos de provas.

Eu não quero mais nada de ti Lídia
Se não a tua felicidade,
E ouvir as tuas gargalhadas,
Nem que isso signifique outro homem.

Mesmo que isso aconteça
Serás sempre minha
Porque mantens a minha Luz acesa
E isso não impediu que apagasses a Tua.

Vai, Vento, leva-lhe um beijo meu,
Toca-lhe na face com suavidade,
Está na hora de ir ver o pôr-do-sol
E contemplar outra vez o teu Olhar.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Dificuldades

Há pessoas que passam a vida a queixar-se. A queixar-se da vida, da sorte, do azar, das circunstâncias, dos outros, delas próprias, de Deus... Como se fossem vítimas de algo que não depende delas, como se não fossem livres nem pudessem fazer as suas escolhas, como se o facto de nem tudo ser fácil seja logo uma razão para não fazer nada, desistir, e fazer a única coisa que sabem fazer bem: queixar-se. Mete-me nojo quem pensa que o mundo gira à sua volta, que por uma mínima dificuldade começam logo a dizer que a sua vida é péssima e desanimam logo, cujo maior problema às vezes é escolher a maquilhagem, uma peça estúpida qualquer de roupa, ou uma rapariga qualquer para engatar. Mas o que sinto ainda é pena destas pessoas, porque têm uma compreensão tão limitada do que as rodeia, porque os seus problemas são tão inúteis e mesquinhos, e ignoram uma série de valores. Se às vezes olhássemos melhor à nossa volta e víssemos tanta gente com mais problemas que nós e que continua em frente, sem se lamentar. Nunca ninguém disse que a vida era justa, nunca ninguém disse que tudo é fácil. mas assim as coisas que vamos conquistando têm mais sabor, e há todo um processo de aprendizagem que é interiorizado. Sim, no fundo tenho é pena porque ao não ter dificuldades e ao desistir estão a seguir o caminho mais fácil, mas menos digno e enriquecedor. Se vale a pena não ir pelo facilitismo? Acho que nem preciso de responder.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Espelho

Sê tu mesmo,
Olha para o mundo com os teus olhos
E não digas que vês outra coisa
Só por os outros dizerem.
De que serve andares a fingir que és outra pessoa?

Deixa as coisas saírem naturalmente,
Diz aquilo que tens a dizer,
Não deixes que o medo te deixe imóvel,
Pois o medo se o souberes enfrentar é inofensivo.
Um gatinho vestido de leão.

Se a vida for um teatro,
Não faças o papel de outra pessoa que não tu.
Se amas alguém,
Não a tentes conquistar oferecendo-lhe
Uma falsa imagem de ti.

Assim quando forem passear,
Se acabarem afastados
Sabes que não é ela,
Se acabarem de mãos dadas
Pode ser que seja ela.
E tudo sem mentiras e fingimentos.

Corres os risco de ter poucas pessoas
Que gostem de ti
Porque as outras, as falsas,
Só gostam de ti se fores
Algo que elas querem que sejas.

Não te preocupes com isso.
De que servem muitos se não
Compreendem o teu interior?
Vale mais poucos mas bons,
Com relações profundas e verdadeiras.

Sim, temos essa necessidade
De ter pessoas que testemunhem
A nossa vida.
Que saibam os nossos sentimentos,
As nossas ideias e dificuldades.

Mas isso não é mau,
Porque o teu coração precisa disso
E desde que cumpras uma condição:
Ser tu mesmo.

Não penses muito
Pensar demais ofusca
Saberes o que realmente queres
E o que realmente és.

Caso contrário
Perderás as oportunidades
Porque quando devias agir
Estiveste a pe(n)sar demais qual era o melhor.

Assim quando te estender a mão
Agarra-a se o que tu és
Está em harmonia com o que sou.

Se for desta maneira,
Reduzirás muitos problemas,
Pois alguns vêm de não espelhares a tua Alma.

terça-feira, 1 de junho de 2010

Dia da criança

Hoje é dia da criança. Por todo o mundo montes de meninos devem ter chegado ao fim deste dia com enorme entusiasmo e alegria. Ir ao cinema, não ter aulas, fazer actividades ao ar livre, artes plásticas, torna este dia especial para eles. Mas no entanto o que eu queria falar é de todas as crianças que são, em termos físicos, adultas. Todas as pessoas que, apesar de todas as dificuldades, de todas as críticas, de serem forçadas pelo mundo a crescer e a ter os “alegados” comportamentos de adulto, de associarem o conceito de “criança” à ingenuidade, palermice, continuam com ela bem viva dentro de si.
O que é ser criança afinal?
Ser criança é oferecer uma flor como se fosse a coisa mais valiosa do mundo (e na verdade não será?) e receber uma flor como se de um diamante se tratasse.
Ser criança é esboçar um sorriso quando se olha as estrelas, quando se vê o pôr-do-sol, quando se vê um pequeno gesto de amizade e ajuda.
Ser criança é, como nos diz o Principezinho, olhar para um desenho “aparente” de um chapéu e ver uma cobra que engoliu um elefante.
Ou seja, ser criança é olhar com um sorriso e sorrir perante as pequenas e importantes coisas da Vida.

domingo, 23 de maio de 2010

Ricardo Reis Revisited

Ah, Lídia, tanta coisa poderíamos ver,
Tanta coisa visitar,
Tanto mundo por explorar,
Mas fiquemos aqui.

Para mim basta-me sentir o toque da tuas mãos,
O cheiro suave dos teus cabelos
E a doçura do teu olhar.
Não preciso de mais nada.

Deixemo-nos estar aqui sentados,
A conversar sobre coisas inúteis ou profundas,
Em serena harmonia,
Somente os nossos corações sozinhos.

Passamos a vida a entreter-nos,
Digo-te eu Lídia,
Enquanto vejo aquele rosto alegre
Das pessoas que passam à nossa frente.

Porque mais tarde ou mais cedo,
Por mais que andemos ou corramos,
A tristeza espera-nos no fim,
Sombria e implacável.

És livre Lídia,
Podes ir embora e deixar-me.
Porque só há beleza quando há liberdade,
Não se deve arrancar uma flor do jardim.

Caso contrário acabará por murchar.
A beleza fez-se para contemplar,
Não para ser presa nem amarrada.
Um pássaro na gaiola deixa de ser belo.

Porque a verdadeira Beleza
Vem do interior,
Aí é que está a sua essência.
O exterior é só uma manifestação.

Por isso é que o mais importante
Em ti, Lídia,
É olhar para os teus olhos
E ver o rosto da tua Alma.

Vai, Lídia, não te preocupes comigo.
Quem ama é livre e deixa em liberdade.
Percorre o Mundo,
Porque o tempo já é pouco.

Lembrar-me-ei de ti
Em cada gota de orvalho,
Em cada raio de sol,
Em cada dia passado.

E quando ao fim do dia
Contemplar o pôr-do-sol
Esboçarei um sorriso,
Pois estou a ver a imensidão do teu Olhar.

sábado, 23 de janeiro de 2010

Objectivos de Vida

Era uma vez um homem cujo o único objectivo era marcar a história do Mundo. Vivia obcecado com esse desejo, fartava-se de estudar, trabalhava nas férias, dormia pouco, alimentava-se mal… Ano após ano trabalhava mais e mais, estudava mais e mais, na ânsia de atingir o seu objectivo, que no fundo não sabia bem como alcançar. Chegou a ter uma namorada, mas ela deixou-o porque via que ele não se interessava, só falava para os pais no estritamente necessário, ignorava o resto da família, deixou de conviver com os poucos amigos que tinha. Os anos passaram e chegou a um dia em que se viu sozinho. Olhava para a sua casa, para sua vida e só lhe vinha uma palavra à cabeça: solidão. Que estúpido tinha sido, só via o seu objectivo idiota à frente. Tinha deixado tudo de lado, até a sua felicidade, que pensava que poderia alcançar quando marcasse toda a história… Sim, então percebeu que as coisas mais importantes da vida eram pequenas e só lhes damos o devido valor quando as não temos. Porque o mais importante não é a história Universal, mas as pequeníssimas Histórias do nosso dia-a-dia, das pessoas que encontramos e devíamos ter dado a mão, das palavras que ficam por dizer.
(Baseado num texto Bíblico)

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Estudos Científicos

Parece que saiu há pouco um estudo científico que revela que as loiras têm mais auto-confiança e determinação que as morenas ou ruivas. Afinal parece que o senso comum está enganado, quando associa o conceito de “burrice” a uma loira. Mas será que a cor do cabelo e o tom de pele influenciam assim tanto a personalidade de uma pessoa? Não será que o carácter de alguém vai muito mais além das características biológicas? Penso que Einstein tinha razão quando dizia que a imaginação é melhor que a ciência, uma vez que uma é limitada e outra não.
Vejamos outro exemplo: um estudo científico revela que alguns homens traem porque possuem nos seus cromossomas um gene que os impele a serem infiéis. Outro mais recente diz-nos que uma parte dos homens trai as suas queridas esposas ou namoradas porque possui uma quantidade elevada de testosterona.

Já estou a imaginar a cena:
"Chega o marido a casa:
-Boa noite querida!
-Onde é que andaste para chegar tão tarde?
-Fiquei mais um bocado no escritório a adiantar trabalho.
-Tretas! Andas-te foi no marmelanço com a nova secretária, e não me mintas, que eu sei de fonte segura!
-Pronto, é verdade… Mas vê isto. (dá-lhe um envelope)
-Que é isto?
-Fiz uma análises e vê lá tu que tenho aquele gene que “faz” os homens ser infiéis e tenho um quantidade de testosterona muito alta. Já estás a ver que a culpa não é minha, é o meu organismo, que precisa. E a secretária foi uma moça tão bondosa que se dispôs logo a satisfazer as minhas necessidades.
-Oh, querido, desculpa! Como pude duvidar de ti!
- Desta vez desculpo. Já devias saber que te amo mais que tudo."

Ah, já me esquecia que a principal diferença entre o Homem e os outros animais é o facto de o ser humano ter consciência de si e poder controlar os seus instintos. É só um pequeno pormenor. Devemos imenso à Ciência, mas está fora da sua compreensão coisas que vão além dela, como o amor e a amizade. Porque por mais atraente que seja a pessoa a nossa frente, a pessoa que amamos é a mais Bela do mundo.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Hoje apetece-me escrever

Hoje apetece-me escrever neste “papel”. Deixar aqui todas as emoções, tudo o que sinto. Mas no meio de tantas dúvidas, no meio de tanta saudade, no meio de tanta melancolia, não me sai nada.

Hoje apetece-me escrever. Escrever, escrever, encher esta “folha” de letras, palavras, frases e esvaziar a minha alma. Às vezes era bom ser inconsciente, passar pela vida e olhar para ela como um velho que sentado num jardim, observa tudo à sua volta e fica quieto, pois para onde quer que nos voltemos acabaremos sofrer.

Hoje apetece-me escrever. Afinal escrever é uma forma de tornarmo-nos livres. E ao mesmo tempo que escrevo, voo, imagino, desabafo, sonho, fantasio, descarrego. E no fim de me esvaziar, pode ser que deixe de sentir este vazio, porque quanto mais cheio estou de sentimentos, mais vazio eu me sinto.

Hoje apetece-me escrever. Afinal até é bom ser consciente, se não me apetecia escrever. Digo, é óptimo ser consciente, porque assim vivo realmente, não sou como o gato ou a ceifeira. Por mais coisas más que existam, ou que eu imagine que existam, nunca perderei a esperança nem a força de vontade, para chegar àquilo que quero (se eu ao menos tivesse a certeza do que quero). Mas as dúvidas são as únicas certezas que há. E sei que há Alguém que me ajudará a ajudar-me.

Hoje apetece-me escrever. Afinal o papel é um monitor de computador e a página é um texto do word. Não importa, o que interessa é que escrevi. Por mais sem lógica que esteja, escrevi.
Amanhã não sei se me apetecerá escrever. Mas também ninguém conhece o Amanhã. E ainda bem.