domingo, 4 de julho de 2010

Ricardo Reis Revisited III


Sabes, Lídia,
Se olharmos à nossa volta com atenção,
Reparamos que a maioria das coisas
Que movem as pessoas são ilusões.

Rio-me da inconsciência de quem
Quer agarrar o mundo,
Como se o pudesse ter sempre.
Mas nada é realmente nosso.

Tudo é passageiro Lídia,
A única coisa que podemos decidir
É se é fugaz e intenso,
Ou tranquilo e suave.

De qualquer forma,
Independentemente do caminho,
Sofreremos no fim.
Isso é o que nos assusta a todos, Lídia.

Faz-nos fugir, tentar ignorar,
Mas nada podemos fazer.
Nenhuma lei pode ilegalizar e prender o sofrimento.
Deixa-nos cicatrizes, faz-nos crescer.

Mas ultrapassá-lo totalmente é impossível
Porque é ele que nos espera no fim.
Por mais fortes, por mais persistentes.
Trata-se só de adiar o que é certo.

Se a vida são dois dias, Lídia,
E um é para acordar,
O outro tem que ser
Para tentar voltar a adormecer.

Tentar voltar a dormir a vida,
Tentar recuperar a ingenuidade,
Porque percebemos que o mundo é sofrimento,
E aterroriza-nos pouco poder fazer para mudar isso.

Deixar de ter consciência que estamos
Somente a distrair a vida.
(Ou talvez seja ela que nos distrai?)
A sentir como ela é tão relativa.

Mas tu mudaste esta forma de ver as coisas, Lídia.
Acordaste e não perdeste a ingenuidade.
Continuas com um sorriso como estado natural.
E não perdeste o brilho nos Olhos.

Não sei se estás acordada,
Ou somente a sonhar enquanto dormes.
Mas afinal, que interessa?
Fascina-me, ver isto em ti.

Consegues ser algo que nunca serei.
Não percebo como gostaste ou ainda gostas de mim.
Ainda bem que foste,
Não te mereço.

Serve-me de consolo que o meu amor
Seja como a tua maneira de ser.
É única coisa que me faz dormir um pouco da vida,
E só por isso vale a pena.

Dói estar sempre a acordar,
Mas sabe tão bem adormecer.
E tudo graças a ti, Lídia,
Que deste para sempre um outro significado ao meu pôr-do-sol.

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