quinta-feira, 15 de julho de 2010

Mundial



Bem, e lá acabou o Mundial no domingo. Desilusão para alguns, alegria para outros, festa para muitos, na primeira competição deste tipo realizada em África. A Espanha não praticou um futebol tão bom como o do Euro 2008, mas foi um justo vencedor. O Uruguai talvez tenha sido a principal surpresa, se bem que os seus adversários até à meia-final não tenham sido "tubarões", mas isso de longe que não lhes retira o mérito, já que demonstraram muita determinação e capacidade de luta, para além de terem o eleito melhor jogador, Diego Forlan. Não foi um Mundial para as "estrelas", como Messi, Ronaldo, e que deixou sem dúvida um sabor um pouco amargo a nós portugueses. Mas não falemos de coisas tristes.
Falando de figuras fora de campo, não se pode deixar de referenciar o molusco cefalópode actualmente mais conhecido mundialmente, o polvo Paul. Porquê? Como toda a gente sabe, adivinhou todos os resultados da Alemanha no Mundial, bem como que a Espanha iria vencer a final. Como o fez? Eram-lhe dadas duas caixas de comida, cada com uma bandeira, e a caixa de onde tirasse o alimento seria a da selecção que ganharia (ainda não percebi muito bem como é que seria se Paul quisesse prever um empate, mas não interessa). Em suma, as visitas ao seu aquário na Alemanha dispararam, é uma autêntica vedeta, e já recebeu uma proposta de transferência (qual jogador, qual quê) para um aquário espanhol. Já foram feito pedidos para que passe um resto de vida tranquilo (tem mais de dois anos, está a ficar velho para um polvo, não sobreviverá para o Euro2012), o que eu acho difícil, dado que um polvo que é vidente, obviamente que preocupar-se-á com questões profundas, como a vida para além da morte, e então nunca ficará descansado.
Do lado feminino, para além do episódio romântico do beijo de Casillas à sua namorada que o estava a entrevistar depois da final ganha, há que destacar Larissa Riquelme, pela forma entusiasta como apoiou a sua selecção, o Paraguai, chegando até mesmo a dizer que se despia caso eles chegassem às meias-finais. Agora já todos percebemos porque é que Óscar Cardozo estava a chorar depois de perder com a Espanha, não foi por ter falhado um penaltie, mas porque assim ela já não se despiria.
Segundo um estudo de um banco holandês, a Espanha também sairá beneficiada economicamente desta Copa, pois consta que o país vencedor obtém ganhos de produtividade, e consequentemente, um maior crescimento do PIB. Foi uma competição com muita excitação, sem grandes incidentes, uma demonstração por parte de África do que é capaz. No entanto a maioria dos estádios ficarão agora às moscas. Lembro-me da pergunta que fizeram a um sem-abrigo sul-africano sobre se o Mundial lhe tinha trazido algo de bom ou alguma vantagem. "Nada", foi o que respondeu. Afinal, também há vida para além do futebol.

domingo, 4 de julho de 2010

Bom ou mau?


O dia 1 de Julho de 2010 foi um dia marcado por um acontecimento (relativamente) importante. Não porque foi o aniversário de alguém que morreu (certamente que foi, só que não é isso que vou destacar), ou porque nasceu alguém com potencial para tornar o mundo um local melhor (bem, isso só saberemos daqui a uns anos). Não a grande notícia é que foi um dia de uma coisa a que nos começamos a habituar: aumento de impostos.
Uma senhora, quando entrou de manhã no autocarro, e viu que o preço do bilhete tinha aumentado 5 cêntimos, começou logo a protestar e a dizer mal do país. Só espero que essa opinião assim como muitas outras que por aí andam tenham como base uma breve reflexão. Não é só ver que os preços aumentam e começar logo a dizer mal disto e daquilo. Muitos pontos se podem destacar, e queria referir alguns.
Na campanha eleitoral para as legislativas, quando os partidos eram questionados sobre aumentos de impostos, todos os partidos garantiram firmemente que isso não ia acontecer. Apesar de alguns dizerem isso porque acreditavam que não era o caminho certo, temo que alguns tenham feito isso por demagogia. Em cerca de um ano algumas coisas mudaram, como a pressão dos mercados, as descidas de "rating", a exigência de medidas de austeridade por parte de Bruxelas (ou melhor, da Alemanha), colocaram uma forte pressão na urgência de tomar medidas para equilibrar as contas públicas. Ah, e de acrescentar que um défice que era previsto para ser à volta de 7%, por magia, afinal é 9,4% (afinal voltou a ser 9,3%, segundo novas contas do INE). No entanto não seria preciso ser muito inteligente para analisar as contas públicas e perceber que, mais tarde ou mais cedo, teria de se aumentar receitas ou cortar na despesa. O que se coloca em questão, é que há um problema estrutural na despesa pública em que falta tocar seriamente.
Estará também em causa numa altura em que a crise financeira e económica não acabou, pôr em prática medidas de impacto recessivo na economia, isso talvez deixasse Keynes boquiaberto. De recordar que ter défice não é algo mau, desde que seja utilizado para propulsionar o crescimento económico de forma sustentada. Em Portugal, talvez tenha havido um despesismo em coisas fúteis e investimentos duvidosos. Desde regalias excessivas, a subsídios atribuídos a pessoas que não mereciam, gastos em construções que não têm retorno nem grande utilidade para o grosso da população... Agora, como se gastou em coisas desnecessárias, retira-se o dinheiro às pessoas que realmente precisam e trabalham.
Finalmente, uma pequena questão interessante em relação ao aumento do IVA. Há situações em que a oferta decide não aumentar preços, e suportar o imposto, como por exemplo num café. Em outras, o consumidor suporta todo o imposto, como nos medicamentos. Mas numa situação de mercado normal, o consumidor não suporta todo o imposto, como muitas vezes se pensa. A quantidade de imposto suportado pelo consumidor e produtor depende da elasticidade da oferta e da procura, ou seja, da sensibilidade em relação ao preço. Assim, por exemplo, o consumidor suportaria totalmente o imposto se a elasticidade da procura fosse 0, isto é, se o consumidor procurá-se sempre a mesma quantidade independentemente do preço. O mais próximo desta situação seria com bens alimentares, essenciais à sobrevivência.
Fica uma breve reflexão, uma análise mais profunda fica para os especialistas. Há uma grande diversidade de pontos de vista, sendo que estas medidas visam uma sustentabilidade de longo-prazo, no entanto o longo-prazo não é se não mais do que uma soma de vários curtos-prazo.

Ricardo Reis Revisited III


Sabes, Lídia,
Se olharmos à nossa volta com atenção,
Reparamos que a maioria das coisas
Que movem as pessoas são ilusões.

Rio-me da inconsciência de quem
Quer agarrar o mundo,
Como se o pudesse ter sempre.
Mas nada é realmente nosso.

Tudo é passageiro Lídia,
A única coisa que podemos decidir
É se é fugaz e intenso,
Ou tranquilo e suave.

De qualquer forma,
Independentemente do caminho,
Sofreremos no fim.
Isso é o que nos assusta a todos, Lídia.

Faz-nos fugir, tentar ignorar,
Mas nada podemos fazer.
Nenhuma lei pode ilegalizar e prender o sofrimento.
Deixa-nos cicatrizes, faz-nos crescer.

Mas ultrapassá-lo totalmente é impossível
Porque é ele que nos espera no fim.
Por mais fortes, por mais persistentes.
Trata-se só de adiar o que é certo.

Se a vida são dois dias, Lídia,
E um é para acordar,
O outro tem que ser
Para tentar voltar a adormecer.

Tentar voltar a dormir a vida,
Tentar recuperar a ingenuidade,
Porque percebemos que o mundo é sofrimento,
E aterroriza-nos pouco poder fazer para mudar isso.

Deixar de ter consciência que estamos
Somente a distrair a vida.
(Ou talvez seja ela que nos distrai?)
A sentir como ela é tão relativa.

Mas tu mudaste esta forma de ver as coisas, Lídia.
Acordaste e não perdeste a ingenuidade.
Continuas com um sorriso como estado natural.
E não perdeste o brilho nos Olhos.

Não sei se estás acordada,
Ou somente a sonhar enquanto dormes.
Mas afinal, que interessa?
Fascina-me, ver isto em ti.

Consegues ser algo que nunca serei.
Não percebo como gostaste ou ainda gostas de mim.
Ainda bem que foste,
Não te mereço.

Serve-me de consolo que o meu amor
Seja como a tua maneira de ser.
É única coisa que me faz dormir um pouco da vida,
E só por isso vale a pena.

Dói estar sempre a acordar,
Mas sabe tão bem adormecer.
E tudo graças a ti, Lídia,
Que deste para sempre um outro significado ao meu pôr-do-sol.