quarta-feira, 27 de julho de 2011


Estás só. Ninguém o sabe. Cala e finge.

Mas finge sem fingimento.

Nada esperes que em ti já não exista,

Cada um consigo é triste.

Tens sol se há sol, ramos se ramos buscas,

Sorte se a sorte é dada.

Ricardo Reis

sexta-feira, 22 de julho de 2011

And every breath we drew was Hallelujah


O Hallelujah está mais tranquilo. Vai-se purificando, tal qual uma pedra se vai alisando pela água do rio, vai-se transferindo de um estilo fulgurante Alexandra Burke para um mais suave (e talvez mais profundo) Jeff Buckley. E tal como a pedra sofrerá erosão dia após dia, ano após ano, destinada ao desaparecimento, o Hallelujah irá ficando cada vez mais longínquo, e cada vez mais puro, até acabar por ser esquecido. Mas não foi isso que me fez escrever este texto. A vida passa, as pessoas mudam, o tempo avança, e nós também precisamos de avançar. Muitos Hallelujah’s passaram, muitos momentos foram aqueles em que a dor de ouvi-lo era enorme. Chegou a altura não de esquecer o Hallelujah, mas de colocá-lo no sítio devido, num lugar no coração onde só há magia e sonho, e a tristeza não existe. Chegou a altura de deixar de ter pena de mim mesmo, de amaldiçoar o tempo e lamentar o seu avanço inexorável. No fundo, é aquela sensação de que não se conseguiu ainda ultrapassar, como um marinheiro que todos os dias contempla o oceano imensas horas com saudade da altura em que as ondas eram o seu mundo.

Viveu-se hoje um Hallelujah assim tremido, algures entre o passado e o presente, condicionado por tudo o que o tempo levou com indiferença, misturado por lágrimas tímidas de cinzas e diamantes. Suave, tal como o pé que sente o toque do musgo das pedras do riacho. E não sei que mais hei-de escrever, porque as palavras são limitadas, é como tentar colocar a beleza de um arco-íris e a melancolia da chuva num papel.

Tal como o estudante que promete que para a semana é que se agarra aos livros, sei que o marinheiro continuará a ir para a praia, sentindo a dor da saudade e a alegria do sabor leve a maresia. Mas assim como sei que não irei avançar, também sei que acredito demasiado neste Hallelujah para dizer que ele está destinado ao esquecimento. Aquilo que está no coração acabará por durar para sempre, porque isso fará com que cada gesto seja diferente, cada palavra mais profunda, cada respiração seja Aleluia. Fará com que alguém neste momento escreva um texto que no fundo poderia ser sintetizado numa simples e mágica palavra: Amizade.

Este é o Nosso Hallelujah, para sempre.

sexta-feira, 8 de julho de 2011




Um dia vamos mudar o mundo. Sim, um dia pegamos naquilo que acreditamos, vamos pelas terras fora, mudamos as pessoas, e tornaremos o mundo um lugar melhor, seja lá o que isso for.
Pedalaremos pela amizade, por todos os momentos bons e maus, por todas as coisas insólitas que ninguém mais fará, porque somos únicos e verdadeiros, seja lá o que isso for.
Caminharemos sentindo o aroma suave da erva ressequida pelo calor, observando a paisagem, sentindo a suave brisa na face, gritando para o vazio onde a solidão reina.
Subiremos montanhas, caminhos íngremes, e quando chegarmos ao alto, com a ilusão de vitória, olharemos para a estrada que fizemos com dificuldade, e para o longínquo horizonte, onde imaginaremos o mar, ou planícies douradas.
Continuaremos mesmo quando as pernas pedem descanso, e o corpo tem uma inércia enorme, mas nada disso é importante, porque estamos juntos.
Depois perceberemos que a verdadeira vitória acontece quando subimos as montanhas mais altas do mundo, que são aquelas que existem dentro de nós. E também que o sono ajuda o corpo cansado, mas talvez ainda atormentará mais a alma.
Faremos piqueniques nos lugares mais esquisitos, e ficaremos a apreciar cada momento, sabendo que tudo acaba, ao mesmo tempo que falamos como crianças, tentando recuperar a inocência do passado.
Seremos vírgulas, em vez de pontos finais,
Seremos sempre inocentes, no fundo. Enquanto tudo viver no coração, seremos todos sempre as crianças ingénuas e felizes, e o passado deixa de existir, porque é presente, é magia e sonho.
Finalmente, perceberemos que nada mais importa: o que interessa é viver cada momento tocando a eternidade de cada riso, de cada esforço, de cada palavra. O que interessa é seguir o caminho, lado a lado, pedalando, correndo, andando, descansando, mas nunca desistindo.

E, quando chegarmos ao topo da montanha de nós próprios, que subimos a pensar que a Felicidade se encontrava lá em cima, descobriremos que Ela esteve sempre ao nosso lado, ora nos acenando, ora nos tocando levemente na face.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Embriaga-te

Deves andar sempre ébrio. É a única solução. Para não sentires o tremendo fardo do tempo que te pesa sobre os ombros e te verga ao encontro da terra, deves embriagar-te sem cessar: com vinho, com poesia, ou com virtude. Escolhe, mas embriaga-te.
E se alguma vez, nos degraus de um palácio, sobre as verdes ervas de uma vala, na solidão morna do teu quarto, tu acordares com a embriaguez atenuada, pergunta ao vento, à onda, à estrela, à ave, ao relógio, a tudo o que passou, a tudo o que murmura, a tudo o que gira, a tudo o que canta, a tudo o que fala; pergunta-lhes que horas são: "São horas de te embriagares. Para não seres como os escravos martirizados do Tempo, embriaga-te, embriaga-te sem descanso. Com vinho, com poesia, ou com a virtude."

Charles Baudelaire